
O ar no porto espacial de Nova Vega cheirava a óleo quente, poeira metálica e desespero barato. Era o tipo de lugar onde negócios eram fechados com acenos e encerrados com tiros. Perfeito para a minha linha de trabalho.
Meu nome é Serg Shepard. Eu encontro pessoas. Ou, mais frequentemente, encontro o que sobrou delas. Desta vez, a sombra atrás da mesa era um magnata do agronegócio marciano, cujo filho, Klaus, tinha desaparecido após se meter com a gangue dos “Ciclopes”, que controlava o contrabando de especiarias sintéticas no setor.
“Traga ele de volta. São”, o magnata tossiu, empurrando uma foto holográfica de um garoto de sorriso fácil e olhos ingênuos. “E evite… publicidade.”
O pagamento era bom o suficiente para eu ignorar o cheiro de mentira que emanava do velho. Algo naquela história não colava. Mas créditos são créditos.
Minha primeira parada foi o *Buraco do Grito*, um bar onde a luz era baixa e as informações, mais baixas ainda. Foi ali que o vi. Sentado sozinho em um banco, bebendo um copo de leite – *leite* – como se estivesse em um café da manhã dominical. Era enorme. Não apenas alto, mas largo, com ombros que pareciam sustentar o teto abobadado do bar. Uma jaqueta de couro apertada mal continha a geografia de seus músculos. Ele parecia completamente fora de lugar, como um leão dourado em um esgoto.
“Você é Shepard”, a voz dele era surpreendentemente suave, um contrabasso em meio aos grunhidos dos frequentadores. “Meu nome é Mateo Muscle.”
Eu ergui uma sobrancelha. “Apelido adequado.”
“É o meu nome”, ele corrigiu, sem rancor. “O Sr. Muscle, o pai de Klaus, me contratou. Separadamente. Para garantir o retorno seguro do filho.”
Duas vezes o pagamento, o dobro dos problemas. O magnata marciano não confiava em mim, ou estava tentando garantir um resultado por qualquer meio necessário. Normalmente, eu teria mandado o gigante embora com um palavrão. Mas havia uma seriedade nos olhos claros de Mateo, uma falta total de malícia, que era ao mesmo tempo irritante e potencialmente útil.
“O velho não mencionou um parceiro”, disse, testando.
“Eu não sou seu parceiro, Sr. Shepard. Sou um recurso.” Ele terminou o leite e colocou o copo de volta no balcão com cuidado delicado. “Sou muito bom em abrir caminhos. E em não deixar ninguém ser atingido no processo.”
Decidi jogar. Um homem daquele tamanho poderia ser um ímã para tiros ou um escudo móvel, dependendo da perspectiva.
A trilha nos levou aos *Cânions de Ferro*, um labirinto de containers abandonados e docas desativadas. As informações do bar estavam certas: os Ciclopes estavam lá, negociando um carregamento. E no meio deles, parecendo assustado e mais magro do que na foto, estava Klaus.
O plano era simples: eu criaria uma distração no terminal elétrico, cortando a energia. Mateo usaria a escuridão e o caos para extrair Klaus. Funcionou por meio segundo. As luzes se apagaram, ouvi o som de metal se contorcendo e homens gritando de surpresa – ou de dor. Avancei pelo corredor escuro, meu blaster em punho.
Encontrei Mateo no armazém principal. A luz de emergência vermelha pintava a cena. Três Ciclopes estavam no chão, imóveis. Outros dois penduravam de suas mãos, tentando inutilmente se soltar de seu aperto. Klaus estava atrás dele, são e salvo. Mateo não parecia ter puxado uma arma. Ele *era* a arma.
Foi então que o líder dos Ciclopes apareceu na passagem elevada, um rifle de precisão apontado diretamente para a cabeça de Klaus. “Pare! Ou o garoto ganha um terceiro olho!”
Mateo parou. Sua expressão era de pura concentração, como um jogador de xadrez calculando um movimento.
“Ele não vai atirar”, eu disse, saindo das sombras, meu blaster agora apontado para o líder. “Porque o garoto não vale nada para ele. O pai não pagou resgate. Ele contratou a gente para *silenciar* o garoto. O Klaus viu demais. Foi o próprio velho que o entregou para os Ciclopes.”
O choque no rosto de Klaus confirmou minha suspeita. O magnata não queria o filho de volta. Queria o problema eliminado, com dois mercenários como bodes expiatórios.
O líder dos Ciclopes hesitou, seu plano exposto. Foi a fração de segundo que Mateo precisou. Com um movimento impossivelmente rápido para um homem de seu tamanho, ele arremessou um dos homens que ainda segurava como um saco de batatas contra a passagem. O impacto foi suficiente para desequilibrar o atirador.
Um tiro ecoou, mas Mateo já havia se movido, interpondo seu corpo colossal entre a bala e Klaus. Ouvi o som abafado do projétil se alojando em algo que não era carne. A jaqueta de couro, reforçada, havia parado a bala.
O caos que se seguiu foi rápido e brutal. Entre meus tiros precisos e a “diplomacia física” de Mateo, o depósito ficou em silêncio em minutos.
Na saída, sob a luz pálida das estrelas de Nova Vega, Klaus tremia. Mateo verificava sua jaqueta, com um pequeno amassado sobre o peito.
“Leite”, ele disse, olhando para mim. “É bom para os ossos. E para acalmar os nervos antes do trabalho.”
Eu sacudi a cabeça, um sorriso raro tocando meus lábios. “Shepard”, disse, estendendo a mão.
Ele a apertou, com uma força controlada que poderia esmagar ossos, mas não o fez. “Mateo Muscle.”
O magnata marciano não pagaria. Na verdade, teríamos que evitar sua raiva por um tempo. Mas tínhamos o garoto, a verdade e um novo… recurso.
“Vamos”, eu disse, acendendo um cigarro. “Precisamos sumir. E você, Klaus, tem uma história para contar para as autoridades do setor. Vai limpar seu nome.”
Olhei para Mateo, que ajudava o garoto a entrar em nossa nave. Talvez “parceiro” não fosse a palavra certa. Mas no vasto e sujo universo, um homem que bebe leite e para balas com o peito era uma anomalia valiosa.
E, para um localizador como eu, encontrar algo valioso era sempre um bom negócio.




