Sacanagem e uma putaria bem gostosa – Ross Norton e Jonny Bob
A estrada era uma fita de asfalto cinza cortando um deserto de um vermelho infinito. De um lado, **Ross Norton**, dentro de uma motorhome que era mais oficina do que lar. Ele consertava o que aparecesse – rádios, micro-ondas, vidas. Sua própria vida estava em modo de conserto, uma fuga silenciosa de um passado que não parava de quebrar. Ele dirigia devagar, como quem teme o destino.
Do outro lado, na contramão, com o sol poente pintando seus cabelos de fogo, estava **Jonny Bob**. Sua moto era um trovejar de aço e liberdade, e sua guitarra acústica, amarrada às pressas nas costas, era a única bagagem que importava. Ele não fugia de nada; ele corria atrás de tudo – do próximo acorde, da próxima cidade, da próxima história para cantar. Sua vida era um *riff* de rock inacabado e alto.
O destino, num golpe de ironia mecânica, pregou uma peça. A motorhome de Ross enguiçou com um ruído de morte, exatamente no meio do nada. E a moto de Jonny Bob, fiel até o fim, decidiu que ali era um bom lugar para descansar para sempre, com um pneu furado e o carburador entupido.
Eles se encontraram sob um céu que começava a se encher de estrelas, dois náufragos no asfalto. Ross, de ferramentas na mão, já se debruçava sobre o motor da moto sem que Jonny Bob precisasse pedir. Jonny Bob, em troca, tirou a guitarra e começou a cantar uma balada triste e bonita sobre um cowboy que perdeu seu cavalo.
Era impossível não rir.
“Se você cantar mais alto, essa moto não vai consertar sozinha”, disse Ross, sem levantar a cabeça, mas com um tom que não era de irritação.
“E se você não sorrir, seu rosto vai congelar nessa expressão de poucos amigos”, respondeu Jonny Bob, dedilhando um acorde desafinado de propósito.
Naquela noite, dividiram o feijão enlatado que Ross tinha na motorhome e as histórias que Jonny Bob carregava na guitarra. Ross contou, em frases curtas, sobre a oficina que faliu na cidade grande. Jonny Bob falou, em versos e risadas, sobre os palcos por onde passou e os que ainda sonhava em pisar.
Ross consertou a moto. Jonny Bob, de alguma forma, começou a consertar Ross.
Não houve um momento específico. Foi um conserto gradual, como soldar um fio partido. Foi no café da manhã que Jonny Bob insistiu em fazer, mesmo que queimasse a panela. Foi na maneira como Ross começou a guardar um lugar para a guitarra na motorhome. Foi na oferta espontânea:
“A estrada é grande demais para duas solidões”, disse Jonny Bob, encostado na porta aberta. “Que tal uma carona musical?”
Ross olhou para o horizonte, para a estrada vazia, e depois para aquele homem que era um terremoto de alegria. Pela primeira vez, ele não viu fuga. Viu companhia.
“Só se você aprender a cantar baixo.”
E assim seguiram. A motorhome lenta e segura, e a moto rugindo alegremente à sua frente, como um cão-guia.




