Luciano Heart fucks Bruno Dib
O vento noturno no calçadão de Santos carregava o cheiro de maresia e o eco distante de um samba. Dois homens caminhavam em silêncio, um contraste perfeito sob os postes de luz amarelada.
**Luciano Heart** tinha o andar descontraído de quem nasceu ouvindo o ritmo das ondas. Roupas claras, um sorriso fácil nos lábios, olhos que pareciam guardar o reflexo do próprio mar. Era o dono do “Coração da Praia”, o bar mais frequentado da orla, onde turistas e locais se misturavam ao som do chorinho e do forró. Luciano acreditava na lei da simpatia, do bom atendimento e na rede invisível de favores e sorrisos que mantinha seu negócio florescendo.
Ao seu lado, **Bruno Dib** era uma figura cortante. Terno escuro, postura rígida, olhos que escaneavam o ambiente não em busca de beleza, mas de pontos cegos, riscos, variáveis. Era o novo consultor de segurança contratado por um grande conglomerado que estava comprando propriedades à beira-mar. Seu trabalho era avaliar ameaças, calcular riscos e garantir que o “progresso” encontrasse o mínimo de resistência possível. E o “Coração da Praia”, com seu charme despretensioso e sua localização cobiçada, estava no meio do caminho de um novo e luxuoso empreendimento.
“É um negócio simples, Sr. Heart”, disse Bruno, pela primeira vez rompendo o silêncio. Sua voz era plana, profissional. “A oferta é mais do que generosa. Com esse valor, você pode abrir dois bares em áreas mais… promissoras.”
Luciano parou, encarando o mar escuro. “O ‘Coração’ não é um negócio, Bruno. É um ponto de encontro. É onde o Zé da Banca comemorou o casamento da filha, onde a Dona Marta desabou quando perdeu o marido, onde o time de futebol da areia comemora os gols. Não se vende um ponto de encontro.”
Bruno não sorriu. Aprofundou a análise. “Sentimento. É uma variável instável. Pode se tornar uma vulnerabilidade.” Ele pausou. “Há pressões que podem ser aplicadas. Inspeções sanitárias inesperadas, revisão de alvarás, complicações com fornecedores… Ninguém precisa sofrer. Basta ser realista.”
Luciano olhou para o consultor. Não viu malícia, apenas uma lógica fria e aterradora. Bruno não era um vilão de cartilha; era um homem que acreditava piamente que tudo, inclusive a alma de um lugar, tinha um preço e um ponto de ruptura.
Os dias seguintes foram uma prova silenciosa. Uma inspeção encontrou “irregularidades” no sistema elétrico do bar. Dois fornecedores de bebidas cancelaram contratos sem explicação. O alvará de funcionamento foi colocado em “reavaliação”.
Em vez de se abater, Luciano Heart usou sua arma secreta: a comunidade. A notícia se espalhou. Os clientes fiéis se tornaram uma multidão. Advogados aposentados ofereceram consultoria grátis. Jovens faziam mutirão para ajudar nas reformas exigidas. O bar, longe de esvaziar, ficou mais lotado do que nunca, transformado em um símbolo de resistência.
Bruno Dib observava de um carro do outro lado da rua, anotando tudo em sua prancheta digital. Seu plano estava falhando. A “variável sentimento” não havia colapsado; havia se fortificado. Ele calculou o custo de medidas mais agressivas e o risco de criar um mártir e um escândalo público. O número era desfavorável.
Uma noite, Bruno entrou no “Coração da Praia”, sozinho. O som ao vivo era ensurdecedor, a energia palpável. Ele se sentou no balcão. Luciano, servindo uma cerveja, aproximou-se.
“O senhor venceu”, disse Bruno, sem rodeios, sua voz quase perdida na música. “Minha análise indica que o custo para remover você e seu estabeleimento excederia em 40% o valor projetado do terreno sem a resistência. A corporação cancelou o projeto para este lote.”
Luciano assentiu, servindo um copo d’água para o consultor. “Não se trata de vencer, Bruno. Trata-se de pertencer. Você calcula preços. Eu calculo pessoas.”
Bruno bebeu um gole d’água, estranhando o gosto simples e a ausência de um plano claro a seguir. Pela primeira vez, seus cálculos não lhe diziam o próximo passo.
“O que você fará agora?”, perguntou Luciano, genuinamente curioso.
“Vou embora. Há outros projetos, outras variáveis para analisar”, respondeu Bruno, mas sua convicção soava oca.
“Ou pode ficar”, disse Luciano, com um sorriso de verdade. “Preciso de alguém para ajudar a organizar a festa de aniversário do Zé da Banca. É uma variável complexa: três bandas, cinco barracas de comida, e um bolo do tamanho de uma jangada. Talvez você consiga calcular quantas velhas cabem nele.”
Bruno Dib olhou para o barulho, o caos organizado, as pessoas que riam sem medo. Olhou para seus cálculos mentais, que agora só mostravam erro. E então, muito lentamente, pela primeira vez naquela semana, algo próximo de um sorriso tocou seus lábios. Era um cálculo novo, uma equação desconhecida. Ele acenou com a cabeça, aceitando o copo d’água e, talvez, o desafio. A batalha tinha acabado, e ele, o estrategista, estava agora em território totalmente desconhecido: o território do coração.




