O antigo kartódromo da cidade estava prestes a ser demolido. Para muitos, era apenas um amontoado de asfalto rachado e cercas enferrujadas. Mas para Alejandro_20, Alex Tremo e Fran Toledo, era o santuário do “Falcão Noturno”.
O “Falcão” era um kart caseiro, uma criação de adolescente feita de sucata, sonho e muito suor. Há dez anos, eles o construíram juntos: Alejandro_20 (cujo nome real era Alejandro, mas o número 20, de sua antiga camisa de futebol, sempre grudou) era o engenheiro, o cérebro por trás dos ajustes milimétricos. Alex Tremo, irônico e franco, era o piloto de provas, destemido e com reflexos de gato. E Fran Toledo, sempre pé no chão, era o estrategista e o “faz-tudo”, conseguindo uma peça aqui, um favor ali.
A fama do “Falcão Noturno” era lendária nas corridas clandestinas que aconteciam ali à meia-noite. Ele nunca foi o mais potente, mas era o mais esperto, vencendo por precisão e astúcia. Até que a vida adulta os levou para caminhos diferentes: Alejandro virou técnico em uma oficina, Alex foi tentar a sorte como piloto profissional no exterior, e Fran abriu um pequeno café.
A notícia da demolição os reuniu novamente, com um misto de saudade e melancolia. Encontraram o “Falcão” coberto de poeira e teias de aranha no fundo da garagem de Alejandro.
“Está uma carroça”, disse Alex, batendo no chassis com os nós dos dedos, mas seu olhar traía uma centelha da antiga chama.
“O motor está travado, as correias estão podres”, diagnosticou Alejandro, já examinando com olhos clínicos.
Fran, calado, observava o kartódromo vazio através da porta do galpão. “O ‘Carcará’ do Tavinho ainda corre por aí”, comentou, referindo-se ao seu maior rival de outrora, um kart muito mais moderno. “Ouvi dizer que ele desafia qualquer um para uma última corrida. Amanhã, antes da chegade das máquinas.”
Um silêncio pesou no ar. Era uma ideia insana. O “Falcão” estava em frangalhos, eles eram homens de quase trinta anos, não mais garotos impetuosos. Mas o olhar entre os três disse tudo. Não era sobre vencer. Era sobre despedida.
A noite inteira foi de trabalho febril. Alejandro ajustou, soldou, reinventou. Alex, com sua experiência profissional, deu dicas preciosas sobre tração e frenagem. Fran conseguiu, de fontes misteriosas, um óleo especial e os melhores pneus que o orçamento apertado permitia.
Ao amanhecer, o “Falcão Noturno” estava no grid, rangendo, mas de pé. Do outro lado, o “Carcará”, brilhante e ameaçador, pilotado por Tavinho, que os cumprimentou com um sorriso de deboche.
A corrida foi caótica. O “Falcão” chiar, soltou fumaça e claramente sofria a cada curva. Alex, porém, pilotava com uma sabedoria que a juventude não tinha. Usava cada falha do asfalto a seu favor, freava milésimos mais tarde, traçava linhas que só ele enxergava.
