Antonio Pena bottoms for Tommy Dreams
O ar no “Café Limiar” sempre tinha um cheiro diferente: pó de estrelas caídas misturado com borra de café e o leve odor de ozônio de um portal mal fechado. Era um ponto de encontro para entidades de planos adjacentes, um lugar onde sombras tomavam chá e fantasmas discutiam filosofia. Na mesa do canto, a mais distante da luz turva da janela, dois clientes regulares se encontravam.
Antonio Pena era um Catador de Ecos. Sua aparência era a de um homem de meia-idade comum, com um sobretudo surrado, mas seus olhos viam o que a maioria não percebia: as marcas deixadas pelas emoções fortes no tecido da realidade. Uma briga apaixonada deixava um brilho cor de vinho no ar, por horas. Um ato de coragem pura deixava um resquício dourado e frio, como fósforo queimado. Antonio coletava esses ecos em frascos de vidro âmbar, não para vendê-los, mas para estudá-los. Ele acreditava que os sentimentos, uma vez liberados, não se dissipavam completamente; eles se tornavam parte da paisagem invisível da cidade.
Seu interlocutor era Tommy Dreams. Enquanto Antonio coletava o passado emocional imediato, Tommy trabalhava com o futuro bruto e não refinado. Ele era um Prospector de Sonhos. Dormia em encruzilhadas de correntes psíquicas, com uma rede neural de cristal improvisada presa às têmporas, pescando nos rios turbulentos do inconsciente coletivo. Ele não via sonhos individuais, mas os arquétipos que neles apareciam: o monstro do armário que estava especialmente assustador naquela semana, a paisagem de cidade flutuante que muitos compartilhavam, a melodia sem nome que todos assobiavam ao acordar. Ele os registrava em esferas de vidro fosco, onde as imagens se moviam como névoa.




