BR Igor Miller bottoms for Nicola Veneziano
O mundo de Igor Miller era feito de silêncio e precisão. Como relojoeiro em uma pequena loja escura no final da rua, seus dias eram medidos em tiquetaques, seus companheiros eram engrenagens e mecanismos frágeis que só ele entendia. Seus dedos, habilidosos e calosos, traziam de volta à vida o tempo parado de relógios de bolso ancestrais. Igor era um homem de rotinas, de gestos calculados, e acreditava que seu coração batia no mesmo ritmo metronômico de suas criações.
Até que Nicola Veneziano entrou em sua loja, trazendo consigo o caos.
Nicola era uma restauradora de arte italiana, contratada para trabalhar na igreja histórica da cidade. Ela chegou como uma tempestade mediterrânea, com risos altos, hands que gesticulavam como pássaros e um vestido amarelo que era um insulto à penumbra sépia da relojoaria. Trazia um relógio de avô do século XVIII que havia encontrado no sótão da igreja, empoeirado e silencioso.
— Ele parou — disse ela, colocando o relógio gigante sobre o balcão com um baque que fez Igor estremecer. — E o padre disse que só você pode fazê-lo cantar de novo.
Igor examinou a peça com ceticismo. Era linda, mas complexa. Um trabalho de meses. Nicola sorriu, um sorriso que parecia desafiar a própria gravidade. — Eu volto amanhã para ver o progresso — anunciou, e saiu deixando para trás um rastro de perfume de limão siciliano e agitação.
Igor, contra tudo, aceitou o desafio.
Nos dias que se seguiram, Nicola voltou. Todos os dias. No início, era para “ver o progresso”. Depois, era para trazer um café (“Você parece muito pálido, Igor!”), um pedaço de torta de limão (“Para adoçar esse ar amargo!”) e, principalmente, histórias. Ela falava de Nápoles, do sol que escaldava as pedras antigas, do barulho do mar, das cores vibrantes dos afrescos que restaurava.
Igor, inicialmente irritado com a interrupção de sua rotina, descobriu-se esperando por aquela hora do dia. Ele, que consertava o tempo, começou a sentir sua falta quando ela não estava lá. Ele começou a falar também. Falou de sua infância na Alemanha, de como imigrou sozinho, de como encontrava paz na lógica implacável das engrenagens.
